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‘O Sequestro do Voo 375’ reconstrói rapto de avião com medo de tomar lado

A história, no caso, é o famoso sequestro de um avião da Vasp em 1988, em que se tentou derrubar a aeronave no Palácio do Planalto em Brasília

 O Brasil tem um problema com filmes de gênero? Essa pergunta ronda o meio de tempos em tempos, mas ganhou fôlego agora com a crise do cinema nacional nas bilheterias. Quando nossas produções mais comerciais sofrem para fazer 1 milhão de espectadores, é fácil dizer que não sabemos o básico -mesmo que a afirmação em si seja absurda.

“O Sequestro do Voo 375” chega aos cinemas brasileiros como mais uma tentativa de responder essa questão. Começa que é um filme de ação, gênero que com frequência ensaia um resgate por aqui. Além disso, é baseado em fatos -uma constante em longas nacionais dos últimos tempos- e conta com bom orçamento para recriar seus eventos.

A história, no caso, é o famoso sequestro de um avião da Vasp em 1988, em que se tentou derrubar a aeronave no Palácio do Planalto em Brasília. O ato terminaria frustrado, mas com sua cota de tragédia -o copiloto do voo foi assassinado. O único autor do crime, Raimundo Nonato, morreu pouco depois do atentado ser evitado.

O caso fascina pelas particularidades. Nonato, por exemplo, era movido apenas pela ira que sentia do governo de José Sarney, que havia lhe custado o emprego na grave crise econômica. O avião, por sua vez, pousou após o piloto decidir por uma manobra arriscada, um giro em 360°, para atordoar o sequestrador. O movimento até hoje tem sua legitimidade debatida e não reconhecida por oficiais.

Entre a verdade e a ficção, o filme dirigido por Marcus Baldini opta pela lenda como caminho para o entretenimento. Uma decisão que faz sentido na perspectiva geral de “O Sequestro do Voo 375”, que busca o tom de urgência sempre que possível. Essa urgência é bem próxima do cinema americano -tudo é encenado com gravidade, mesmo antes de Nonato sacar o revólver e ameaçar o primeiro comissário de bordo.

A estratégia é boa, bem como a de buscar alguma afinidade entre os principais nomes do caso. Além de Nonato, vivido com intensidade por Jorge Paz, o roteiro de Lusa Silvestre e Mikael de Albuquerque dedica bastante tempo a Murilo, piloto principal do avião e interpretado por Danilo Grangheia.

O longa destaca em ambos o drama familiar, com situações não resolvidas com os filhos, e usa isso dentro da situação do atentado. Há espaço ainda para a operadora de voo, papel de Roberta Gualda, que aos poucos se mostra a única capaz de negociar com Nonato.

Percebe-se aí o quanto a produção acessa Nonato por terceiros, se juntando aos negociadores para tentar entender sua figura. Os poucos momentos que exploram a vida do sequestrador surgem para contextualizar a ação, sobretudo no início. Essas cenas decoram o filme da mesma forma que os detalhes de época, como o fumo no avião ou os comentários dos comissários sobre a novela “Vale Tudo”.

No fundo, isso acontece porque “O Sequestro do Voo 375” está todo investido no seu registro funcional da história. Não é de todo mal. Enquanto o avião sobrevoa o país sem destino certo, a tensão acumulada mantém o filme nos eixos. A narrativa trabalha para informar a ação, que por sua vez segura o público na trama.

Mas essa estrutura precisa estar a serviço de algo, ou se esfacela no primeiro momento em que o suspense arrega. O que acontece na reta final, quando o avião pousa -em um clímax cheio de acrobacias e bocas abertas- e as autoridades precisam resolver a situação de Nonato com os reféns.

O filme a partir daí despenca à procura de um norte, da mesma forma que Murilo duela com o sequestrador para evitar novas mortes. Ao mesmo tempo, dá para acompanhar a ação com algum conforto, até porque “O Sequestro do Voo 375” é desenhado na neutralidade. As peças estão todas lá, bem organizadas e sem ofender ninguém -mesmo a omissão de Sarney na trama pode passar despercebida.

Constrangedor mesmo só os letreiros finais. Depois de informar o destino dos envolvidos na história, se escreve na tela preta que revistas sobre o caso foram encontradas nos esconderijos de Osama Bin Laden. A partir disso, a produção diz que o sequestro do avião da Vasp seria uma das referências dos terroristas responsáveis pelo 11 de setembro.

Aí sim temos um problema. Se orgulhar por se envolver na tragédia dos outros é de um viralatismo inconcebível.

O SEQUESTRO DO VOO 375

– Quando Estreia nesta quinta (7), nos cinemas
– Classificação 14 anos
– Elenco Danilo Grangheia, César Mello e Jorge Paz
– Produção Brasil, 2023
– Direção Marcus Baldini

|IDNews® | Folhapress | Beto Fortunato |Via NBR | Brasil

About Beto Fortunato
Jornalista - Diretor de TV - Editor -Cinegrafista - MTB: 44493-SP

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